site da brabet-Menos roubos e mais feminicídios: como a pandemia influenciou a violência no Brasil

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O levantamento Anuário de Segurança Público, divulgado neste domingo, mostra mudanças nos dados da violência no Brasil no contexto da pandemia de covid-19: crimes contra o patrimônio diminuíram, mas os assassinatos voltaram a subir.
18 out 2020 - 22h02
(atualizadosite da brabet19/10/2020 às 07h20)
Embora os roubos tenham diminuído no Brasil, feminicídios e homicídios dolosos subiram durante a quarentena
Embora os roubos tenham diminuído no Brasil, feminicídios e homicídios dolosos subiram durante a quarentena
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

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Uma mala e outras pequenas bolsas ficaram sobre a cama. Para a polícia, o quarto desarrumado era um indício de que Rosana* estava de saída. Mas não deu tempo. Seu marido invadiu a casa antes, quebrando o cadeado da porta.

O boletim de ocorrência (BO), produzido pela Polícia Civil de Mato Grosso, narra que Rosana, de 46 anos, ainda tentou se trancar no quarto. Mas o marido, de espingarda, disparou contra a esposa, atingindo-a no lado esquerdo do peito. Ela ainda se sentou na cama, colocando a mão no local do tiro. Segundo vizinhos,site da brabetmeio aos tiros, o suspeito ainda gritou: "É, Rosana, eu já te amei…"

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Esse feminicídio ocorreusite da brabetagosto deste ano, durante a pandemia de covid-19,site da brabetuma cidade do interior de Mato Grosso. O principal suspeito do crime, segundo a investigação, é o marido da vítima, que fugiu. Ironicamente, o assassinato aconteceu no mesmo mêssite da brabetque a polícia, coletivos e conselhos de direitos humanos faziam campanha para diminuir a violência doméstica no contexto do isolamento social, no chamado Agosto Lilás.

No primeiro semestre deste ano, os feminicídios aumentaram 2% no paíssite da brabetrelação ao mesmo período do ano passado, segundo o 14º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, divulgado neste domingo. O relatório é produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública a partir de dados fornecidos por secretarias estaduais.

De janeiro a julho, 648 mulheres foram assassinadas no Brasilsite da brabetepisódios classificados como feminicídio — quando o crime é motivado por violência doméstica ou discriminação por gênero.

Para especialistas e profissionais que atuam no combate a esse tipo de crime, o isolamento social fez aumentar os delitos cometidos dentro de casa, como agressões, abusos e assassinatos. Isso teria ocorrido por causa de uma maior proximidade entre vítimas e agressores, além de uma maior dificuldade de realizar denúncias.

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Mas outros tipos de crimes também foram influenciados pela pandemia, segundo o relatório. Alguns deles, como roubos, diminuíram consideravelmente. Já outros, como homicídios, voltaram a crescer depois de um períodosite da brabetqueda.

A BBC News Brasil listou alguns desses delitos. Confira abaixo.

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1 - Feminicídiosite da brabetalta, registros de violência domésticasite da brabetqueda
Protestosite da brabetSPsite da brabet2016 pedindo combate à violência contra a mulher; dados apontam que essa violência tem se agravado no país durante a pandemia
Foto: Agência Brasil / BBC News Brasil

Os dados de violência doméstica parecem contraditórios. Enquanto os feminicídios aumentaram 2% e as chamadas de emergência subiram 3,8%, os registros de agressões feitossite da brabetdelegacias diminuíram 10% no primeiro semestre deste ano.

"É preciso tomar muito cuidado ao analisar esses dados, porque eles indicam claramente que houve um aumento da violência doméstica durante a pandemia, mas também um crescimento da subnotificação", explica Silvia Chakian, promotora de Justiça na área de violência doméstica contra mulher do Ministério Público de São Paulo.

Segundo ela, a alta de assassinatos de mulheres e ligações de emergência à polícia indicam uma intensificação das agressões. "Normalmente, a vítima ou alguma testemunha liga para a polícia quando a situação fica violenta. No caso do feminicídio, é mais difícil haver subnotificação, emborasite da brabetalguns lugares a polícia ainda tenha dificuldade para classificar esse crime", diz.

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Por outro lado, a queda dos boletins de ocorrência apontam uma dificuldade maior das vítimassite da brabetconseguir formalizar uma denúncia à polícia, segundo Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Antes da pandemia, as ocorrências só eram produzidas pessoalmente, na delegacia. Em alguns Estados, isso continua.

"Com as medidas de isolamento social, as mulheressite da brabetsituação de violência ficaram confinadas com os agressores, sem possibilidade de sair de casa, e de circular para ir até uma delegacia. Além disso, a pandemia afetou também a polícia, com inúmeros casos de agentes afastados por doença, gerando uma alteração no atendimento das delegacias", diz.

Para Silvia Chakian, medidas como boletins de ocorrência produzidos pela internet facilitam as denúncias. "Na pandemia, o Estado de São Paulo abriu a possibilidade de BO online, mas essa não é uma realidade no país inteiro. As pessoas não conseguem denunciar. É preciso fortalecer esses canais para facilitar que mulheressite da brabetsituação de violência possam pedir ajuda", diz.

2 - Homicídios voltaram a crescer

Depois de dois anossite da brabetqueda, os homicídios voltaram a crescer no Brasil
Foto: Getty Images / BBC News Brasil

Nos últimos dois anos, o número de crimes contra a vida no Brasil estavasite da brabetqueda. As mortes violentas intencionais (MVI), por exemplo, tinham caído 17,7% no ano passado,site da brabetcomparação com 2018 — no total, 47.773 pessoas foram assassinadas no paíssite da brabet2019.

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Mas agora o cenário se inverteu. Esse tipo de crime cresceu 7,1% nos primeiros seis meses de 2020, quando 25.712 pessoas foram vítimas de mortes violentas intencionais — uma morte a cada 10 minutos.

Em parte, o crescimento foi puxado pelo Ceará, que registrou 96,6% de altasite da brabetrelação ao ano anterior. O Estado viveu, no início do ano, uma grave crise de segurança pública, quando policiais militares ficaramsite da brabetgreve por 13 dias.

Para Luiz Fábio Paiva, professor de Sociologia e pesquisador do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará, a pandemia também teve uma influência na produção de homicídios.

"Em relação ao Ceará, a pandemia chegou num momentosite da brabetque havia uma reorganização do crime e um reajuste da relação de forças entre as facções criminosas. A pandemia mudou a dinâmica econômica dos mercados ilegais. Os grupos armados tiveram que fazer ajustes emsite da brabetatuação, inclusive para sobreviver durante a pandemia, o que pode ter gerado tensões e incremento de conflitos", explica.

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Samira Bueno concorda que a alta de homicídios pode ter a ver com mudanças provocadas pela covid-19. "A pandemia mexeu com os negócios ilícitos, como o tráfico de drogas, que precisou se adaptar. É possível que o tráfico tenha tido mais dificuldade para se reabastecer, ou novas disputas tenham ocorrido. Algo pode estar acontecendo nesses mercados, e é provável que só saibamos o que ocorreu no futuro", explica.

Por outro lado, as mortessite da brabetdecorrência de operações policiais também cresceram — 6% nos primeiros seis meses do ano, com 3.181 vítimas. Os policiais também morreram mais neste período — foram 110 novas mortes, alta de 19,6%.

3 - Menos assaltos a casas e comércio

Roubos a pedestres diminuíram 34% durante a pandemia
Foto: PA Media / BBC News Brasil

Já os crimes contra o patrimônio tiveram uma queda considerável no primeiro semestre deste ano.

Roubos a pedestres, por exemplo, diminuíram 34%, segundo o Anuário da Segurança Pública. Assaltos a carros caíram 22,5%, e roubos de cargas, 25,7%.

Já os assaltos a residências registraram uma queda de 16%, enquanto houve 18,8% menos roubos ao comércio.

"A diminuição dos crimes contra o patrimônio é uma clara influência da pandemia. Como o comércio estava fechado e havia menos pessoas circulando nas ruas durante a fase mais restrita da quarentena, os criminoso tiveram menos oportunidades para agir. O isolamento dificultou a ação de pessoas que atuam nessa área", explica a pesquisadora Samira Bueno.

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4 - Polícia rodoviária apreendeu mais drogas

Outra estatística possivelmente afetada pela pandemia de covid-19 foi a apreensão de drogas ilegais.

A Polícia Federal (PF), que fiscaliza aeroportos, fez menos apreensões de drogas, provavelmente por causa da diminuição do número de voos. Porém, o volume de maconha apreendido quase dobrousite da brabetrelação ao mesmo período do ano passado, chegando a 217 toneladas. Em relação à cocaína, houve uma queda de 2,3%.

Já a Polícia Rodoviária Federal (PRF), que atuasite da brabetestradas e rodovias, aumentou bastante suas apreensões. No primeiro semestre, o volume de cocaína apreendida pela PRF cresceu 56,7%, atingindo 14 toneladas. Já a quantidade maconha presa pelo órgão aumentou 128%, chegando a 316 toneladas.

As apreensões de drogas pela Polícia Rodoviária Federal cresceram durante a pandemia de covid-19
Foto: José Cruz/Agência Brasil / BBC News Brasil

Para Samira Bueno, um fluxo menor na quantidade de carros e caminhões nas estradas pode ter influenciado o incremento das apreensões.

"Com isolamento social e rodovias mais vazias, a PRF conseguiu ser mais efetiva na fiscalização. Uma hipótese que trabalhamos também é que, com menos voos, houve uma diminuição do tráfico por esse meio, e um aumento do transporte de drogas por vias terrestres", afirma.

Para Marcelo Campos, professor da UFGD e do Instituto de Estudos Comparadossite da brabetAdministração de Conflitos, da Universidade Federal Fluminense, o aumento das apreensões não significa que o uso de drogas ilegais tenha caído.

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"Esse aumento de apreensões ocorre há certo tempo, mas não há uma correlação de que apreender mais diminua o uso, como mostrou a guerra às drogas nos Estados Unidos. Um horizonte de mudança na política de drogas e no proibicionismo, como vem ocorrendosite da brabetvários locais dos Estados Unidos, é o que nos faz ter esperança (de diminuição da violência), e não o aumento de apreensões", afirma.

*Nome fictício para preservar a identidade da vítima e desite da brabetfamília.

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Fontes de referência

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